Papa promete ‘ação’ no caso do escândalo de pedofilia no clero

Do G1

Bento XVI usou pela primeira vez a palavra ‘abusos’ ao se referir ao caso.
Pontífice vinha sendo criticado por usar linguagem supostamente vaga.

O papa Bento XVI, que está sendo alvo de críticas de grupos de vítimas por supostamente utilizar linguagem vaga nas referências à crise dos abusos sexuais na Igreja Católica, prometeu publicamente nesta quarta-feira (21) “ação” no caso do escândalo.

No mês que se seguiu à explosão dos casos de abusos sexuais, com alegações crescendo rapidamente nos Estados Unidos, na Áustria e na Alemanha, sua terra natal, o papa usou termos vagos, tais como dizer que a Igreja “estava ferida por nossos pecados” ou precisava de “penitência’.

Falando para seu público costumeiro na Praça de São Pedro, no Vaticano, Bento XVI usou nesta quarta-feira a palavra “abuso” pela primeira vez em mais de um mês, período em que o escândalo se espalhou amplamente e deu origem à maior crise em seus cinco anos de pontificado.

Ao resumir sua viagem de fim de semana a Malta, Bento XVI disse:

“Eu queria me encontrar com algumas pessoas que foram vítimas de abusos por membros do clero. Eu compartilho com elas seu sofrimento e com emoção eu rezo com elas, prometendo-lhes ação da parte da Igreja”.

Grupos de vítimas tinham pedido que o papa dissesse alguma coisa diretamente em público, em vez de fazer referências indiretas e usar termos genéricos.

Um comunicado no domingo, em Malta, depois de ele ser reunir com oito vítimas de abusos, afirmava que o papa faria “tudo em seu poder para investigar as alegações, levar os responsáveis pelos abusos à Justiça e adotar medidas efetivas para proteger jovens no futuro”.

Esse tinha sido até então um dos comunicados mais explícitos do Vaticano, que espera que os bispos locais cooperem com autoridades civis no processo de padres que abusaram de crianças.

Bispo diz sentir vergonha com acusações de pedofilia em AL; veja carta

Da Folha On line

“Vergonha e desonra” são os sentimentos descritos pelo bispo de Penedo, dom Valério Breda, na carta aberta aos fiéis sobre as acusações de pedofilia dirigidas a padres de Arapiraca (AL).

Milhares de cópias do documento foram distribuídas em paróquias da cidade e região no dia 11 de abril, um mês após a divulgação na TV de imagens do monsenhor Luiz Marques Barbosa fazendo sexo oral com um jovem. No programa “Conexão Repórter”, do SBT, ex-coroinhas acusaram três padres de ter cometido abuso sexual contra eles desde quando eram crianças.

Na carta, o bispo de Penedo pede perdão, em nome da igreja –“também ferida”–, a todos os que se sentiram “agredidos” e “traídos em seus sentimentos religiosos e de confiança na igreja” pelo escândalo.

Ele afirma que a igreja apoia as investigações civis sobre o suposto crime cometido pelos sacerdotes e que foram tomadas “as mais extremadas medidas canônicas possíveis” em relação aos padres acusados. Os sacerdotes foram suspensos de suas funções eclesiásticas e respondem a processo.

Dom Valério recomenda ainda aos fiéis a leitura da carta do papa Bento 16 dirigida aos católicos da Irlanda, publicada em março passado, na qual ele aborda o abuso de crianças e jovens vulneráveis da parte de membros da igreja.

Bento 16 afirma no documento que houve falha de alguns bispos e seus predecessores na Irlanda no tratamento das acusações de abuso sexual.

“Queremos aprender do venerado Santo Padre a não ter medo da verdade, mesmo que dolorosa”, diz um trecho da carta do bispo.

Dom Valério termina a mensagem sugerindo aos membros da igreja que se reergam a partir da “restauração da moralidade e da vida espiritual”.

Em outra carta dirigida ao senador Magno Malta (PR-ES), presidente da CPI da Pedofilia, o bispo de Penedo se coloca à disposição para esclarecimentos à comissão.

Leia a íntegra da carta:

“Caríssimos Irmãos e Irmãs Diocesanos!

Que a Páscoa do Senhor dê a todos os dons da alegria e da paz. Com certeza, como proclamou o querido Papa Bento XVI no dia solene da Ressurreição, “salvos na esperança, prosseguimos a nossa peregrinação, levando no coração o cântico antigo e sempre novo: “Cantemos ao Senhor: é verdadeiramente glorioso!”.

Neste horizonte de esperança e de vida nova que renasce, venho oferecer à leitura e à meditação de todos os Diocesanos a importante Carta Pastoral do Sumo Pontífice à Igreja Católica na Irlanda, publicada no dia 19 de março p.p.

A intenção do Papa, contudo, é de se dirigir a toda a Igreja, numa hora de profunda aflição, provocada pelas gravíssimas acusações envolvendo membros do clero em escândalos inauditos, no intuito de oferecer uma análise profunda do fenômeno e traçar as diretrizes norteadoras do caminho que a Igreja deverá seguir.

O Santo Padre vem em nosso socorro também, pois é sabido por todos o quanto a nossa Diocese foi humilhada pelos fatos noticiados recentemente pela televisão. Aliás, quanto a isso queremos reafirmar o nosso veemente posicionamento no sentido de apoiar as investigações civis, ao mesmo tempo em que, imediatamente, tomamos as mais extremadas medidas canônicas possíveis, aplicáveis aos casos denunciados.

Queremos aprender do venerado Santo Padre a não ter medo da verdade, mesmo que dolorosa. Sentimos, sim, “vergonha e desonra” pela violação da dignidade da pessoa humana e lamentamos o golpe desferido contra a Igreja, semeando descrédito e suspeitas.

Em nome da Igreja diocesana, também ela ferida, quero pedir perdão a todos quantos, feridos e escandalizados, se sentiram agredidos em sua integridade e traídos em seus sentimentos religiosos e de confiança na Igreja. A todos gostaria lembrar a palavra do Papa: “Peço-vos que não percais a esperança. É na comunhão da Igreja que encontramos a pessoa de Jesus Cristo, ele mesmo vítima de injustiça e de pecado. Como vós, ele ainda tem as feridas do seu injusto padecer. Ele compreende a profundeza dos vossos padecimentos e o persistir do seu efeito nas vossas vidas e nos relacionamentos com os outros, incluídas as vossas relações com a Igreja. Sei que alguns de vós têm dificuldade até de entrar numa igreja depois do que aconteceu. Contudo, as mesmas feridas de Cristo, transformadas pelos seus sofrimentos redentores, são os instrumentos graças aos quais o poder do mal é despedaçado e nós renascemos para a vida e para a esperança”.

Se, consternados, assistimos a uma verdadeira subversão moral e espiritual, que toca a interioridade mais profunda do homem, devemos decididamente nos soerguer a partir da restauração da moralidade e da vida espiritual. Na verdade o homem é dominado pelo pecado, mas a graça redentora de Jesus Cristo redime e salva. É preciso alcançar este patamar espiritual. “Caritas Christi urget nós” – o amor de Cristo nos impele – (2 Cor 5,16). Seguindo as sábias indicações do nosso amado Santo Padre, Bento XVI, precisamos de um verdadeiro mutirão evangelizador e vivificador: pais e mestres, padres e educadores, catequistas e animadores de comunidades, missionários, todos devemos entrar nesta ação vigorosa. Não bastam eventuais recursos de sabedoria humana: o amor de Cristo nos impele para a medida alta da vida cristã, a santidade. Só os santos renovam a Igreja.

Todos precisamos do Papa: deste Papa, que mais uma vez – para retomar o título da sua última Encíclica – diz a verdade na caridade e pratica a caridade na verdade.

Penedo, 11 de abril, Domingo da Divina Misericórdia.

Dom Valério Breda, bispo diocesano.”

O vigário geral de Munique foi forçado a servir de bode expiatório de Ratzinger?

Do Der Spiegel
publicado no UOL

O papa (de branco) durante um almoço oferecido por cardeais que vivem em Roma para comemorar o quinto aniversário do pontificado de Bento 16

A Igreja Católica responsabilizou o vigário geral aposentado Gerhard Gruber, que serviu a Joseph Ratzinger quando este era arcebispo, pela transferência de um padre sabidamente pedófilo. Gruber está alegando que a declaração da igreja de que ele “agiu por conta própria” jamais foi discutida com ele.

Um plano de emergência foi rapidamente criado pela Arquidiocese de Munique e Freising na noite do dia 11 de março, uma quinta-feira. O jornal Süddeutsche Zeitung expôs o escândalo em torno do padre pedófilo Peter H. e o assunto sobre o abuso sexual na igreja estava aproximando-se perigosamente do papa.

Peter H., vigário da cidade de Essen, na Alemanha ocidental, que molestou meninos em diversas ocasiões, foi transferido para Munique em 1980 para continuar trabalhando como pastor. Como resultado, ele pôde abusar de mais meninos. O arcebispo e diretor do conselho diocesano que aprovou a nomeação de H. foi Joseph Ratzinger, agora papa Bento 16.

Ratzinger também presidiu uma reunião no dia 15 de janeiro de 1980, na qual os arranjos para a moradia e terapia do padre foram discutidos, portanto, tudo indicava que ele deveria ter conhecimento do passado criminal de H. Face a isso, a diocese não poupou esforços nas últimas semanas para explicar por que o atual papa não poderia ser responsabilizado pela permanência de H. em sua diocese.

Esse esforço foi baseado em documentos encontrados no escritório de registros da diocese relacionados a H. e que foram assinados por outra pessoa: o vigário geral Gerhard Gruber, assistente de Ratzinger durante sua época como arcebispo.

Aparentemente ninguém na equipe de gestão da crise objetou a ideia de tirar o papa Bento “da linha de tiro” usando Gruber, um homem de 81 anos, como bode expiatório. Na manhã do dia 12 de março, o escritório de imprensa redigiu uma declaração atribuindo a Gruber plena culpa pela transferência de H. -incluindo uma desculpa pessoal do mesmo. Enquanto isso, um membro da igreja discutia o assunto ao telefone com o vigário geral aposentado.

Gruber, contudo, se sentiu sob pressão e mais tarde confidenciou a amigos teólogos que tinham “pedido” a ele enfaticamente que assumisse total responsabilidade pelo ocorrido. As autoridades da igreja prontamente enviaram um fax com uma cópia da declaração e instruíram o antigo vigário para que fizesse quaisquer mudanças que julgasse necessário.

“Decisões incorretas”

De acordo com a declaração divulgada pela arquidiocese, Ratzinger foi parcialmente responsável pela decisão de aceitar a transferência de H. “Independentemente dessa decisão”, contudo, H. foi designado pelo “vigário geral da época” para assumir as atribuições pastorais, sem restrições, em uma paróquia de Munique. A declaração também dizia: “Gruber assume total responsabilidade pelas decisões incorretas”. Um porta-voz da arquidiocese mais tarde acrescentou que Gruber “tinha agido por conta própria” no caso de Peter H.

Os amigos de Gruber dizem que o idoso só tinha conhecimento de partes da declaração, que ele aparentemente estava sendo usado como bode expiatório e que também estava sobre pressão emocional. Para a surpresa de todos, Gruber escreveu uma carta aberta na qual explicitou que não assinou a declaração da arquidiocese, documento sobre o qual não teve influência. Ele também observou que estava “muito chateado” pela maneira “com a qual os incidentes foram retratados” pela arquidiocese. “A frase ‘agiu por conta própria’ também não foi discutida” comigo, escreveu.

A arquidiocese não quis comentar as acusações de Gruber, exceto para afirmar que continuava alegando que o ex-vigário geral agiu por conta própria no caso de Peter H. e que ele tinha admitido seus erros.

Gruber saiu em viagem para recuperar-se de “semanas muito estressantes”. Sua lealdade é altamente apreciada em Munique. Segundo Gruber, o arcebispo Reinhard Marx enviou-lhe os melhores votos e expressou sua apreciação pela ‘participação’ dele.

Crise pode paralisar pontificado de Bento 16, diz vaticanista

Da BBC Brasil

O escritor e especialista em Vaticano, John Allen Jr., disse que a crise provocada pelos abusos sexuais cometidos por sacerdotes católicos contra menores é a mais grave dos primeiros cinco anos de Bento 16 como líder da Igreja Católica, e que ela corre o risco de paralisar “por meses e anos” o seu pontificado.

O papa Bento 16, que fez 83 anos na semana passada, completa nesta segunda-feira cinco anos à frente da Igreja Católica.

Em entrevista concedida à BBC Brasil em Roma, o vaticanista defende Bento 16 de algumas das críticas e afirma que o pontífice fez, antes e depois de sua eleição, “mais do que qualquer dirigente de seu nível na Igreja para responder bem a esta crise”.

Confira abaixo a entrevista:

BBC Brasil: Quais as conseqüências que a crise provocada pelo escândalo da pedofilia pode ter para o pontificado de Bento 16?

John Allen: Se o Vaticano não desenvolver uma capacidade mais articulada para comunicar e governar, há um sério perigo que este pontificado fique paralisado por meses e anos, em tentativas constantes de responder apenas à crise do momento, invés de prosseguir. Aos olhos do mundo, este pontificado é associado a uma cadeia de crises, isto porque o Vaticano não é capaz de comunicar bem com a realidade.

BBC Brasil: De quem é a responsabilidade por isso?

Allen: O problema é a falta de competência dos colaboradores de Bento 16 em comunicar e em ajudar direito o papa. No caso dos abusos sexuais, os comentários do pregador da Casa Pontifícia, Raniero Cantalamessa (que comparou os ataques ao papa por causa dos abusos à perseguição contra os judeus), do cardeal Angelo Sodano (que na Missa de Páscoa manifestou solidariedade ao papa criticando o “falatório” sobre os abusos sexuais) do cardeal Tarcisio Bertone, secretário de Estado do Vaticano (que disse existir uma relação entre homossexualismo e pedofilia), queriam ser úteis. Eles não tinham consciência de que iriam enfraquecer a Igreja e o papa, que é seu representante.

BBC Brasil: Esta crise então enfraqueceu Bento 16?

Allen: Do ponto de vista da imagem, sem dúvida enfraqueceu. Todos estes escândalos, crises e controvérsias, de certa forma escondem do mundo os aspectos positivos deste pontificado e do papa, cujo ensinamento é elogiado até por pensadores leigos. Isto demonstra uma crise de governo neste Pontificado, porque o trabalho desenvolvido pelo papa não chega às pessoas.

BBC Brasil: Depois dos escândalos da pedofilia de sacerdotes, a igreja ainda tem credibilidade moral?

Allen: A Igreja Católica agora não tem credibilidade para pregar a moralidade ao mundo, se não é capaz de praticá-la dentro de sua casa. Nos Estados Unidos, os bispos contam que quando falam publicamente sobre aborto, homossexualismo ou outro tema moral, abordado pela igreja, os fiéis respondem que não vão ouvi-los enquanto não for resolvida a crise moral dentro da própria Igreja.

BBC Brasil: Nos Estados Unidos, onde esta crise começou, os fiéis deixaram de frequentar as igrejas?

Allen: Quando os casos começaram a surgir nos Estados Unidos, houve a previsão de que os católicos deixariam de ir a missa e de fazer doações econômicas à Igreja Católica, mas isto não ocorreu. A frequência e as doações permaneceram estáveis. Os católicos de qualquer lugar sabem distinguir entre o fundamento verdadeiro de sua fé, isto é, Deus, Jesus Cristo, e a instituição Igreja, e seus dirigentes.

BBC Brasil: Por que, em sua opinião, os casos de abusos praticados por sacerdotes eram ocultados? Havia uma norma que obrigava a manter sigilo?

Allen: Os jornalistas estão à procura da “prova do crime”, um documento ou uma lei que explique porque a Igreja Católica manteve os casos de abusos cometidos por religiosos contra menores acobertados durante tanto tempo. Mas isto é perda de tempo. Não há uma ordem de Roma obrigando a manter o sigilo, mas uma cultura do silêncio criada em séculos, da qual todos eram cúmplices, bispos, papas e todos os católicos. Roma não ordenou o silêncio, mas nem a transparência. É isto que precisa ser mudado, com leis e colaboração com a Justiça Civil . A cultura do silêncio, no entanto, é muito mais profunda e mais difícil de mudar do que uma lei.

BBC Brasil: O que o papa fez até agora para combater a pedofilia na Igreja é suficiente?

Allen: Posso dizer, como vaticanista, que não há o menor grau de dúvida de que este papa, antes e depois de sua eleição, fez mais do que qualquer dirigente de seu nível na Igreja para responder bem a esta crise. Embora a opinião geral sobre Bento 16 seja negativa, devido ao escândalo dos abusos, ele é um renovador porque abateu o muro de silencio do Vaticano sobre este tema. Criou um novo sistema, mais rápido e eficaz, para disciplinar os padres que abusaram, foi o primeiro papa a encontrar as vitimas e adotou a política da tolerância zero. Agora, se estas reformas são suficientes, se tem ainda caminho a ser feito, isto é outra questão e há opiniões diferentes a respeito.

BBC Brasil: Depois dos escândalos a Igreja pode rever sua posição em algumas questões morais?

Allen: Acredito que não haverá mudanças no ensinamento da Igreja Católica com relação a temas como aborto e homossexualismo. O papa e os cardeais estão mais determinados do que nunca a manter o conteúdo deste ensinamento. A consequência da crise, dentro da Igreja, não é favorecer um clima mais flexível e mais aberto a mudanças, mas ao contrario, será mais rígido, controlado e disciplinado.

BBC Brasil: Dois advogados querem pedir a prisão do papa quando ele visitar a Grã-Bretanha em setembro por causa do envolvimento de sacerdotes com abusos a menores. Outras pessoas pediram que o papa renuncie. Isto é possível?

Allen: Estas não são propostas serias. Teoricamente, é possível que um papa se demita, o cânone 332 (do código de direito canônico) contempla esta possibilidade. Mas não acontece com freqüência. Houve cinco, seis ou no máximo sete casos, em mais de dois mil anos de história. Não é uma hipótese a ser levada em consideração.